Caros visitantes,

espero que vocês divirtam-se muito lendo minhas palavras. Peço, porém, por ser esse um trabalho independente, que não republiquem meus textos - inteiros, partes, frases, versos - sem minha expressa autorização. A pena para crime de plágio é dura, além de ser algo bastante humilhante para quem é processado. Tenho certeza que não terei problemas com relação a isso, mas é sempre bom lembrar!

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quarta-feira, 16 de março de 2011

Mente, Mente

“Deite ao meu lado calmamente
mente, mente, mente, mente
e me aperte furiosamente
mente, mente, mente, mente
e me deixe alto
alto, alto”
                           (Robson Borba – “Mente, Mente")

A menina mal tinha dezesseis anos, mas, em sua mente viciada, ela era a criatura mais linda que ele já tinha posto os olhos. Seu cheiro de juventude impregnava o apartamento e ele ficava maluco. Era sua, somente sua e ele poderia fazer o que quisesse com ela. Afinal, ela era sua mercadoria.
Tinha sido comprada – com dinheiro alto – de um traficante de mulheres. Sabia que era o certo. O tal traficante tinha entrado em contato com ele e oferecido as mais maravilhosas garotas da história. E ele acreditou e se deu bem. Tinha a certeza de ter escolhido a melhor de todas.
Quando o outro tirou as meninas (várias, em torno de dez, com idades entre nove e dezessete) do furgão e as colocou em fila para que ele escolhesse, seus órgãos deram piruetas de prazer. Era como um parque de diversões somente para ele! Puxou o cabelo de uma para ver se era forte, fez várias perguntas para outra, deu tapas nas costas de uma terceira, até encontrar Maria Lúcia. A perfeita.
Ela era loira, mas não muito. Em torno de um metro e sessenta. Grandes olhos bem verdes, rosto cor de rosa, parecia saída de um filme infantil. Devia ser de boa família, ele pensou. Tinha trejeitos de madame, apesar dos horrorosos chinelos que calçava. Não queria saber de onde tinha vindo ou qual era seu verdadeiro nome. Para ele, ela era Maria Lúcia, a Perfeita, assim mesmo, com letras maiúsculas e tudo.
Suas roupas estavam sujas, pareciam ter sido banhadas com água podre. Seu hálito era de quem não via uma escova de dentes há vários dias. Puxou-a pela mão, deu o dinheiro ao traficante e levou-a para sua casa. A garota chamou a atenção dos passantes, enquanto se dirigiam ao ônibus que os levaria embora do lugar.
Subiram as escadas e ele ficou contemplando sua mais nova propriedade. Embebedava-se com os olhos dela amedrontados, relutantes. O início do pavor causava-lhe um estranho prazer.
Sentou-se no sofá vermelho e pediu que ela ficasse perto dele. O medo tingiu-la as faces. Não queria, estava bem ali de pé. Levantou-se ele então e foi para a cozinha. O apartamento era bem pequeno, era o máximo que ele podia pagar. O quarto e os outros cômodos era todos o mesmo. Pegou um copo de água e entregou a ela. Não queria que sua nova criatura linda ficasse com sede.
Os olhos reviraram e ele olhou para a parte interna de seu cotovelo. Parecia uma pintura abstrata. Cores verdes, amareladas e muito roxas mostravam-se a quem quisesse enxergá-las. A veia bastante inchada dava sinais de que o sangue ainda por lá corria. Pegou suas seringas já previamente preparadas e sorriu. Ia dividir aquele momento de lazer com sua mais nova convidada.
Maria assustou-se ao vê-lo aproximar-se com a seringa e quis dizer algo, mas ele falou para que se calasse e não arruinasse o momento. Pegou o braço da moça delicadamente e, como um anestesista, aplicou a seringa na veia jovem. Talvez o medo tenha feito com que ela ficasse completamente parada, ao invés de gritar e tentar fugir. A droga correu pelo sangue de Lúcia e ela ficou tonta. Caiu e ficou espalhada no chão, como se fosse uma marionete solta no espaço.
Seus trapos vestidos se desarrumaram com sua queda e grandes porções de sua pele apareceram. Ele abaixou-se e, como um cão, passou a cheirar sua noiva, ao menos, a pobre menina que ele chamava de noiva. Rasgou os trapos e revelou a nudez dos seios da mercadoria. Pequenos, rígidos, ainda não de todo formados. Pôs sua cabeça entre eles e ficou ouvindo os delírios de sua paixão. Passou a beijar o corpo da moça inteiro, rasgando também o remendo que se considerava saia.
O sexo teve um gosto proibido, dolorido. O sangue da primeira vez parecia inundar o sofá. Ele percebera isso, mas não tinha problema. Era um sofá vermelho, seus parcos visitantes sequer notariam o que lá havia acontecido. A menina delirava com a droga e ele aproveitava cada momento. Sentia-se poderoso, quase como Deus, decidindo o que era melhor para ela. Em seu sóbrio delírio iniciado anos atrás, dizia que só queria ajudar as pessoas. E que não fazia nada errado. E que as atitudes hediondas não era erradas. E que o amor não tinha idade.
Pegou outra agulha – tinha acabado de conhecer a moça, não sabia se ela tinha doenças ou não, resolveu não arriscar – e injetou-se também. Ficaram os dois prostrados no chão, depois do amor mal-feito e rápido. Ele sonhava em conhecer os pais de sua noiva, Maria Lúcia, e pedi-la em casamento. Não sabia como iam reagir ao seu pedido. Teria de causar uma boa primeira impressão. Não somente boa, mas ótima. Perfeita. Falaria de assuntos pouco triviais, traria ações da bolsa de valores para uma conversa de cozinha e trocas no governo para o cafezinho. Nem sequer sabia se a moça conhecia os pais ou se fazia alguma idéia de onde moravam, mas nada disso atrapalhava seu delírio de uma vida perfeita.
A Noiva, cada vez mais delirante, passava por uma série de pesadelos e dores físicas. Apesar de ter tentado ser gentil e amoroso, Ele só conseguira causar-lhe dores em diversas partes fazendo com que ela não conseguisse sequer dormir. A principal era o corte feito em seu último traço de humanidade. Tinha sido drogada, arrastada para um apartamento estranho, violada e agora estava jogada no chão como um pedaço de bosta.
Aos poucos, cansados, entraram naquela parte do sono em que não realmente sabemos o que é realidade e o que é fruto de nossa imaginação. E cores, formas, sensações começaram a aparecer, como em uma enorme roda gigante rodando muito ligeiro.
Em suas viagens egotripóticas, não ouviram os policiais que gritavam do lado de fora. Os olhos de ambos fechados não sabiam para onde estavam sendo levados. Uma das garotas conseguira fugir de seu novo dono – um velho político – e denunciar o esquema todo. A policia resolver agir rápido para desmontar a quadrilha de pedófilos. Levaram-no para a cadeia e sua Noiva para o hospital.
No caminho, Maria Lúcia teve reações adversas. Chamava pela mãe, por Deus, pelo Noivo. Seu coração não era forte suficiente e a quantidade de droga em seu corpo era enorme. Duas paradas cardíacas. Silêncio.
Em sua mente ele não tinha feito nada errado. As outras pessoas – ridículos policiais em seus ridículos uniformes – é que não entendiam nada. Ele estava fazendo o bem, estava salvando aquela menina do mal que poderia lhe acontecer se ela caísse em mãos cruéis. Ele amava a menina, por isso a tinha comprado. Tinha-a tocado com amor e cuidado, não queria que nada de mal acontecesse com ela.
Foi jogado em uma cela, com mais vinte. Seus colegas de quarto cuidaram para que ele tivesse uma longa noite de reflexões. Eterna. A mente mente. E ele acreditou nas mentiras de sua própria mente, mente.

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