Caros visitantes,

espero que vocês divirtam-se muito lendo minhas palavras. Peço, porém, por ser esse um trabalho independente, que não republiquem meus textos - inteiros, partes, frases, versos - sem minha expressa autorização. A pena para crime de plágio é dura, além de ser algo bastante humilhante para quem é processado. Tenho certeza que não terei problemas com relação a isso, mas é sempre bom lembrar!

Protected by Copyscape Online Copyright Search

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Carta para meu filho que ainda não nasceu


      Oi. Eu sei que a gente não se conhece ainda, mas eu tenho pensado muito em ti, definido personalidade, cor de olhos e cabelo, jeitos, gostos, idéias e ideais. Não faço idéia se você será como eu imagino (e - em algum lugar aqui dentro de mim - espero que não e espero que sim ao mesmo tempo), mas não importa. Fiquei pensando no que vou te dizer, no que você vai gostar, em como vou te explicar certas coisas desse mundo meio inexplicável. Espero que você goste de macarrão, porque eu adoro e vou te ensinar receitas. Um dia a gente pode fazer macarrão juntos. Fazer a massa desde o início e depois colocar na máquina e espalhar macarrão pela casa inteira. A sua mãe vai ficar louca comigo e contigo. Quero te ensinar a tocar violão, a cantar. Quero conversar sobre meus autores favoritos e quero aprender novos contigo. 

      Sempre pensei em ti, meu filho, mas não tanto quanto tenho pensando ultimamente. Eu acho que você está cada vez mais próximo de sair desse grande paraíso em que você está para vir aqui ficar comigo, viver comigo. Prometo ler para você todas as noites, mas você precisa dormir logo porque vai aprender que eu quando eu fico com sono simplesmente capoto. Um dia vou fazer alguma besteira e você vai descobrir que a fada dos dentes não existe e já peço desculpas antecipadas por isso. Assim como o Papai Noel e o Coelho da Páscoa. Não sei se vou ter dinheiro para sempre lhe dar o presente que você vai querer. É importante que você aprende que não podemos sempre ter tudo que queremos, às vezes o que realmente importa é de graça. Vou te contar a história da sua bisavó e provavelmente repeti-la algumas vezes. Uma vez eu abri um presente e estava tão interessado em ver o que era que rasguei o papel de embrulho e nem dei bola (expressão velha que significa dar importância) para o cartão. Ela me disse que o mais importante era o cartão. Abri e li "Dos seus avós que te amam tanto". Fiquei com vergonha e dei um abraço nela. Realmente o mais importante era mesmo o cartão.

      Espero que você seja um cara bacana e trate bem as mulheres a sua volta. Seu pai estudou com muitas delas e teve que aprender a lidar com elas. São complicadas e complexas, mas não vivemos sem elas, mesmo que durante um tempo elas sejam meio "nojentas". Todo mundo passa por esse período em que não gostamos do sexo oposto. Depois elas amadurecem e você fica feito besta atrás delas. Não me importo se você gostar de meninos, a escolha é sempre sua. Se quiser gostar dos dois, boa escolha! Só peço cuidado. Não se controle demais, não se condene demais, não pense demais. Sabe, alguns relacionamentos a gente tem que simplesmente se jogar e não ponderar muito. Isso só estraga a diversão. Ame, sofra, xingue, faça sexo. Cuide-se, mas não muito. Vai chegar o momento de casar ou viver juntos e talvez ter filhos, que serão meus netos. Pode ser que você escolha não tê-los e isso também está bem. Veja muito filmes. Leia bons livros e leia livros horrorosos, mas sempre mantenha a cabeça funcionando.

      Eu te entendo se uma noite dessas vocês não quiser nada a não ser ouvir música e beber whisky bom. Já fiz isso, meu filho, todos fizemos isso, mesmo que seja com coca-cola. Já passei madrugadas lendo, chorando. Já sonhei coisas felizes e acordei dando risada. Já ri tanto em sonhos que não conseguia mais dormir. Já tive muita insônia. Espero que você escreva também. Que você tenha cadernos espalhados pela casa, para anotar seus pensamentos, compromissos, frases de filmes, letras de músicas ou até desenhos, coisa que seu pai nunca foi bom. Eu até tentei desenhar, sua avó é uma desenhista de mão cheia, mas esse gene eu não peguei. Quem sabe você pegue.

       Abrace muito, meu filho, o mundo sempre vai precisar de mais abraços. Daqueles de verdade, cheios, carinhosos, que dizem "estou aqui com você para o que der e vier". Abrace seus amigos, abrace seus avós, abrace sua esposa, abrace sua mãe e me dê grandes abraços também. Tomara que você tenha um bicho de estimação. Qualquer um deles, peixe, ave, gato, cachorro. O que você preferir. Espero que seja um cachorro. Eu amo cachorros. Queria que você escutasse música comigo.

        Um dia você também vai ser pai e vai cuidar do seu filho. Vai querer exterminar todos que mexerem com ele, vai vibrar com as novidades da escolinha. Espero que você gosta da escolinha que escolhermos para você, tenha certeza que vai ser pensando no seu melhor. Se você simplesmente odiá-la a gente troca, não tem problema. Queria que você gostasse de ter longas conversas sobre a vida. Ou não. Mas queria saber que você tem a certeza de que eu vou estar sempre aqui com e por você. Uns dias serei extrovertido e engraçado, outros serei mais sério. Em nenhum deles amarei você mais ou menos, sempre te amarei milhares, saiba disso.

       Um dia eu vou precisar de você. De você e da retribuição do amor e cuidado que eu vou te dar a vida toda. Ficarei mais velho, filho, e esquecerei coisas óbvias, talvez não te dê tanta atenção como antes, mas o meu amor continuará o mesmo. Talvez você pense que eu não presto atenção em ti, mas presto. E estarei lutando contra essa coisa doida que é a velhice, o ser de um outro tempo. Talvez não escute mais tão bem e você tenha que repetir algo várias vezes. Repita.

       Quero te levar para tomar cerveja em diversos bares para que a gente possa conversar sobre a sua vida, sobre o seu futuro, sobre o que você viu na faculdade ou no trabalho. Espero que você estude algo que você goste e consiga se achar logo. Espero que você tenha amigos tão queridos como os que eu tenho. Eu conheço muita gente, meu filho, e você vai perceber isso com o tempo, mas posso contar na mão os amigos com quem posso contar para tudo. Esses são os que deixo mais próximo ao coração. Vou te emprestar meus discos e meus livros, se você prometer que vai cuidar. Você sabe como eu sou em relação a eles.

      Essa carta é estranha porque você ainda não existe. Não importa, sei que você vai existir, sei que você está se formando no País Que Sempre Faz Verão e sei que você virá em um futuro não tão distante assim. Sei que você vai passar por poucas e boas com e sem mim. Você vai chorar, você vai rir e sangrar e reclamar e ficar feliz e amar e brigar e tudo o mais.

      Eu estarei do seu lado, te observando de perto e de longe. Quero que você seja feliz, meu filho, tão feliz quanto eu tenho certeza que serei quando te olhar nos olhos pela primeira vez. Prometo - e isso está prometido e deve ser cumprido - tentar ser o melhor pai do mundo. Farei algumas bobagens, te chatearei várias vezes, mas sempre procurarei me remediar. E pode ter certeza, meu garoto, que você vai ser o filho mais amado do mundo.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Primeira Esquizocrônica

                                                           
para Caio Fernando Abreu 


Minha miopia aumentou. Isso só faz com que eu enxergue  a vida de forma ainda mais diferente. Algumas coisas ficam meio borradas, os olhos secam e eu tenho que ver tudo com um olho só ou outro. Tenho umas dores internas, uns troços que eu não sei explicar bem. Parece que estão lá tentando me arrancar de dentro de mim mesmo. Ando curtindo cozinhar e ouvir música portuguesa. Aquela coisa meio chorada, mas que eu adoro. Eu tenho mesmo um quê desesperado, está no sangue, eu acho. Fico pensando em quem já foi sem ter ido, pessoas que foram muito próximas, mas que agora são nada mais que meros estranhos. Não sei o que fazem e não sei se gostaria de saber. Sinto falta de algumas, até passei por cima de meu orgulho e tentei contato com algumas. Nesse mundo internético, a sensação que dá é que mandar um email é menos invasivo do que telefonar, quando eu acho que deveria ser o contrário. E eu contrario o contrário. O que eu gostaria mesmo era de ter tempo de visitar todos os meus amigos e ficar por horas conversando sobre a vida. Aquelas de filosofia mesmo que vai ficando cada vez menos analítica e cada vez mais alcoólica. O tempo está incrivelmente quente eu não consigo dormir. Olho pela janela e vejo a cidade ao redor de mim, suas luzes acesas e vesgamente me divirto. Se ficamos vesgos, elas brincam de fazer outras formas e eu fico meio cego por uns segundos, talvez por isso que a miopia esteja aumentando, enfim. Quero ir sempre em busca da luz. Andei meio nas trevas esses últimos dias. Me irritava com pouco. Ou muito, depende do ponto de vista. No caso, estou falando do meu. Sou incrivelmente pessoal, sempre. Não devia porque acabo falando de mim e depois as pessoas acham que me conhecem intimamente. Não, não, caros, como podem me conhecer intimamente se nem eu me conheço, oras? Até eu mesmo peço licença a mim mesmo para conversar e conhecer mais sobre eu mesmo. E nessa educação toda entre mim e eu ou eu e mim, já nem sei mais do que estava falando. Quero muito ir para a Argentina, aproveitar que o peso está baixo. A barra está meio pesada, na verdade, mas estou falando de dinheiro. Queria comprar todos os discos do Fito Paez e Charly Garcia e sentar em frente à Casa Rosada e imaginar Evita Perón cantando “Don’t Cry For Me, Argentina”. Não consigo lembrar de Eva Perón sem lembrar de Madonna estragando tudo naquele filme ridículo. Gosto do Antonio Banderas, mas o que me irrita é ele ter aceitado esse esteriótipo tosco de latin-lover e aceitar todo e qualquer papel em que é o amante e/ou marido sedutor. Jamais vou perdoá-lo por cantar “Al Otro Lado del Rio”, do Jorge Drexler. Ainda bem que ganhou, mesmo com o Banderas e o Santana (esse é outro!) destruindo tudo. E não no bom sentido. Lembro do Che e quero fazer a viagem que ele fez, mas de carro. Sei lá se eu conseguiria sentar em uma moto e viajar tanto quanto ele e o Granado, provavelmente não. Deixo isso para meu amigo Sydnei. Estava calor, tirei toda a roupa, para alegria ou alergia dos vizinhos. Agora estou com frio. Vou colocar a cabeça no travesseiro. Quem sabe o tremor dos meus pensamentos me embale. Sei lá.