Caros visitantes,

espero que vocês divirtam-se muito lendo minhas palavras. Peço, porém, por ser esse um trabalho independente, que não republiquem meus textos - inteiros, partes, frases, versos - sem minha expressa autorização. A pena para crime de plágio é dura, além de ser algo bastante humilhante para quem é processado. Tenho certeza que não terei problemas com relação a isso, mas é sempre bom lembrar!

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domingo, 28 de agosto de 2011

Pretérito Imperfeito

Eu queria amar você
Sim, queria
Queria poder planejar passeios no parque
e piqueniques na beira do rio

Queria poder andar de bicicleta com você
Você liderando e eu atrás tentando te acompanhar
Seus olhos brilhantes sempre assertivos
Guiando nosso caminho

Queria poder conhecer tua mãe e ouvir todas as histórias da família
Conhecer teu pai e saber porque ele te chamou assim
Teus primos para me contarem as fofocas

Amar assim como amam os românticos amantes de livros românticos
Desenfreadamente, sem obstácculos, sem objeções
Sem noção
                  de espaço
                            tempo
                                   direção

Queria poder casar com você e termos filhos
Vera, Chuck and Dave, todos fãs de Beatles
embebedarmo-nos de livros e discos
de vinhos e champanhes
de whisky, por que não?

Queria poder viajar com você
Alugar um carro e conhecer a Europa
comer macarrão nas vinícolas italianas
lambuzar-me de delícias ao seu lado

Queria poder ser seu pra sempre
e exclusivo
e único

Queria poder ser seu Arlequim
E você minha Colombina
Você minha Satine
e eu seu Christian
Você Julieta clássica
e eu seu Romeu

Queria poder te amar loucamente
Queria poder sentir o sabor de estar contigo
e banhar-me nos prazeres de ti

Queria poder
queria poder
Poder
Mas não posso

Eu não te amo.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Poderosas

para Karina Mochetti

Ele certificou-se de que a moça estava sozinha antes de fazer seu primeiro, digamos, movimento. Levantou-se com ar sexy da mesa do fundo do bar e ia em direção ao objeto de sua observação ininterrupta dos últimos trinta minutos quando a perna falseou e ele resolveu tornar a sentar. Tinha tremido nas bases, como dizem por aí. E se a cantada que tinha preparado não desse certo, não fosse boa o bastante?
Era muito direta: “Você é linda como um raio de sol”. Tinha visto isso em um filme e o mocinho ficou com a mocinha, mas havia o detalhe do rapaz ser muito bonito e ele sabia não ser a beleza o seu ponto forte.
Pensou em outra. Chegar perguntando para a moça se o pai dela era ladrão. Ela iria irritar-se, óbvio, e dizer que não, oras, onde já se viu. Aí ele diria que o pai só poderia ser ladrão, pois havia roubado a luz das estrelas para colocar nos olhos dela. Ridículo. Tinha certeza que ela o acharia ridículo se falasse isso.
Sua irmã mais velha sempre lhe falava que deveria tentar ser natural, que essa coisa de cantada é para fracos e que as mulheres nem sequer vêem com bons olhos essa tentativa toda pré-preparada. “O melhor”, dizia ela, “é o incerto, o inesperado, aquela surpresa de primeiro encontro”. Isso só tinha servido para deixá-lo ainda mais nervoso e neurótico.
Do que raios ele falaria? Como poderia entabular uma conversa quando o que ele mais queria era beijá-la, massagear seu corpo e ter herdeiros. Ela não era uma deusa grega e estava longe disso, mas nosso herói achava-a a mais linda do bar.
Política? Não, não, as mulheres não gostam de falar sobre isso. Roupas? Ela poderia até gostar do assunto, mas ele não sabia nada, nem o mínimo suficiente para iniciar um galanteio.
Ela parecia tão poderosa. Ele amava as mulheres poderosas, mas morria de medo delas. Tanta opinião, tanta coisa que tinham vivido, e ele era nada mais do que um cara muito simples, com uma vida simples e um passado bem chato. Nada de extraordinário havia acontecido em sua existência.
Talvez filmes fossem interessantes, mas se lembrou de que os últimos que tinha visto era sobre a segunda guerra mundial. Não conseguia lembrar também de nada romântico para dizer-lhe.
Ela estava no balcão, conversando com o dono. Tinha um drinque colorido em sua frente e ria, animada pela conversa. Estava entretida no que fazia. Ele foi se aproximando, sentindo seu cheiro, as ondas dos cabelos de leve, vendo os detalhes da roupa mais de perto. Ainda não sabia como chamaria a atenção da garota, mas não conseguiria ficar enfiado naquela mesa por mais nenhum segundo olhando de longe.
Pediu um drinque. Pensou em algo chique. “Um martíni, por favor”, claro. E com a azeitona. Chique, para uma garota facilmente impressionável.
Ela nem estava prestando atenção, mas quando o drinque chegou ela virou para ele e sorriu, despreocupadamente, até um tanto cúmplice. Tambores africanos rufaram, o mar se abriu e ele sorriu de volta. Pronto. Era aquilo só que ele precisava para melhorar sua noite.
Quando foi abrir a boca para iniciar a conversa que poderia mudar suas vidas para sempre, ele ouviu uma voz da outra ponta do balcão. Era uma outra mulher que chamava. Linda como a luz da lua.

- “Júlia?”, disse aquela linda como a luz da lua.
- “Oi, meu amor! Nossa, Ciça, como você demorou! Achei que eu fosse ficar aqui sozinha e abandonada para sempre!”, respondeu aquela objeto de observação de trinta minutos.
- “Me desculpe. Meu chefe ficou falando sobre um novo projeto na agência e não conseguia me desvencilhar dele. Deixei o estagiário adiantando tudo e vim te encontrar o mais rápido que pude.”

E beijaram-se. Na boca. De língua. E o bar inteiro viu. Nosso herói olhou aquilo, estatelado. Engoliu em seco várias vezes. As duas saíram de lá de mãos dadas, batendo papo alegremente e foram em direção a uma mesa perto da janela.
Ele olhou para o copo, mordeu a azeitona, secou o conteúdo. Sussurrou para si – “mulheres poderosas! Oras, para o inferno com elas!” –  disse, entre dentes.
Pegou seu casaco e foi embora sem pagar, pisando duro, irritadíssimo.

E elas lá conversando e rindo e sendo felizes. E poderosas.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

From the Dead Poet's Society

"I went to the woods because I wanted to live deliberately. I wanted to live deep and suck out all the marrow of life. To put to rout all that was not life, and not when I had come to die, discover that I had not lived" (Henry David Thoreau)

"Eu fui à Floresta porque queria viver livre. Eu queria viver profundamente, e sugar a própria essência da vida. Expurgar tudo o que não fosse vida; e não, ao morrer, descobrir que não havia vivido"

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Romper! Romper! Romper, Poeta!

Romper! Romper! Romper, Poeta!
Escrever para romper, rasgar, expurgar
Tenho o som, o barulho das ondas em meus ouvidos a soluçar
E que sentido tenho sentido
Se sou só mais um barco a navegar nesse tolo mar de incertezas
que é a vida?

Romper, esgarçar a alma, a vida, o sonho!

Olho em volta e me assusto
Com os homens mortos vivos zumbis
Que vivem e não sonham
O que é viver sem sonhar?

Mortos vivos isolados em suas putrefatas vidas de merda
e eu megamalabarizo a minha
Poesia breve, de leve, para cuspir a inércia

Sufocar os sonhos é para os tolos
Os desesperados se agarram ao desejo e
fazem o que podem e o que não podem para tê-los
para vê-los saciados

Os idiotas vomitarão palavras de ordem
E se sentirão galãs
Que podridão de merda, de merda
São tão importantes e imponentes quanto um carrilhão de merdas produzidas por eles próprios e que servirá o prato e a mente de seus filhos e netos massas de manobra alegres e contentes famílias felizes

Rompa, Poeta, rompa!
Rompa a bolha da ignorância, da inércia,
da apatia e da vida não vivida.

Carpe diem! Carpe Diem!

Esqueça os tolos, tolos são cretinos caretas,
caretas corretos que estão por aí em toda parte
e ficam por aí ocupando espaço tão somente espaço
oferecendo espaço vazio de suas mentes à caretice maior

Rompa, Poeta e Carpe Diem!

CARPE DIEM! NOW! AGORA!

Já não enxergo como antes

Existe um bloqueio em meus olhos
Uma miopia indesejada
um véu de ignorância de futuro
de desejo de passado
Um véu que se transforma em cortina
e não me deixa ver o outro lado
Um tule artístico que me perturba

Romper essa vida e viver de verdade

Venha viver comigo, minha doce poesia
Poesia vã, venha cobrir de beijos esse poeta louco atormentado

Sinto saudades de tempos atrás
Não sou mais o mesmo que fui

E ainda bem

ROMPER! ROMPER! ROMPER!

CARPE DIEM! CARPE DIEM!

GRITAR! GRITAR! GRITAR! PULAR! GIRAR!

C
 A        M
  R      E
   P    I
    E  D

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Tumultos

para Pedro, personagem do ator Bruno Garcia, da minissérie "Queridos Amigos", de Maria Adelaide Amaral, e para mim também, um pouco.

Sabe que eu acho uma loucura essa nossa vida de hoje. Acordar cedo, antes do sol muitas vezes, engolir um café, um pedaço de pão de dias atrás, correr para pegar o önibus ou ligar o carro, correr para não chegar atrasado, trabalhar pensando no almoço ou na volta pra casa. Não curtir os pequenos momentos. Acho uma doideira. Hoje eu levantei no meio da noite de um sonho intranqüilo, como Gregor Samsa, e, ao contrário dele, eu não havia me transformado em um inseto monstruoso, mas estava perto. Abri os olhos, levantei da cama e olhei em volta como que para certificar de que estava de volta jogado ao mundo real e que minhas alucinações tinham ficado no sonho e felizmente não haviam cruzado as barreiras da fantasia mental. Só lembro do meu quarto olhando assim, de baixo, deitado. Não lembro dele olhado de pé. Não olho meu quarto. Levanto cedo e vou realmente acordar quando já estou no carro, depois do café. Às vezes sem café, às vezes sem vontade. O trabalho enobrece, dizem por aí. Eu sei. Talvez. Essa visão de poeta torto amargurado é que não me deixa ver as coisas. Amargurado com nada. Não tenho vida suficiente para ser amargurado e me enredo nos meus sonhos de grandeza. Queria ser dono de um flat em Nova Iorque. Queria ter um apartamentinho e viver de escrever. Queria ter vinte mil pessoas me vendo cantar e cantando comigo. Queria ter gurias se esgoelando por mim. E não queria nada disso. Essa indecisão, essa incoerência, essa inconstância, me enlouquece, mas não muito. Não tenho pretensão de ficar louco ou qualquer coisa assim. A loucura é para os gênios e eu não sou gênio nenhum. Sou regular. Não. Regular, não. Mas seguramente não gênio. Eu sei é que o tempo passa e ele sim é irregular, louco, pervertido e perverso. A passagem do tempo pode endoidecer e eu já nem mais saber o que raios estou escrevendo. Será que é isso que chamam de “delirius tremem”? Acordar de um sonho louco e escrever? Será que é isso que os grandes escritores fazem? Aproveitar o pó do sono nos olhos para ver o mundo com outros olhos? Tumultos me habitam vira e mexe e me viram e me mexem e me devolvem depois. Alguns me mudam para sempre, alguns me jogam de volta na inércia de não fazer nada, de não ter feito nada, de não ter ambição para porra nenhuma. Não se entregue, não me entrego. Me podo. Me corto. Me estilhaço. E ninguém nem percebe porque é tudo eu. Tudo eu mesmo que faço comigo. Essa cobrança eterna, essa loucura interior. Essa falsidade. Ser falso consigo mesmo é se matar estando vivo. Eu não matei minha mulher. Eu matei nossa vida em conjunto. Eu matei a tal da união. Me passa aquela xícara de café, por favor.