Caros visitantes,

espero que vocês divirtam-se muito lendo minhas palavras. Peço, porém, por ser esse um trabalho independente, que não republiquem meus textos - inteiros, partes, frases, versos - sem minha expressa autorização. A pena para crime de plágio é dura, além de ser algo bastante humilhante para quem é processado. Tenho certeza que não terei problemas com relação a isso, mas é sempre bom lembrar!

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domingo, 24 de abril de 2011

I shall keep dancing my life until there's only one thing left: music.

I have always thought that our lives should come with soundtracks, as in the films. Music has such an influence in my life as a songwriter (and not only that - as a human being too) that I wish everyone could have the same kind of experience. I sing all the time. Regular noises make me sing. Sometimes a slamming door reminds me of a song or just a beat. As childish as is it may seem, I really don't want it to be different. I have a collection of more than a thousand albums, divided into CDs, LPs, mp3, k-7 tapes and so on. Each and every one consist in a part of my life.
I associate people to songs and I often find myself not listening to those particular songs because I remember someone that I don't want to remember. On the other hand, it also happens when I want to remember people. And those are probably the toughest moments. My deceased aunt was a songwriter and she has left me a k-7 tape with some of her songs in a very poor recording. It is gold to me and every time I feel sad that she's gone and will never come back, I listen to her tape and cry. This catharsis through music has helped me to overcome the loss of beloved ones and they have also being the soundtrack, as I said, to many happy periods!
I listen to music to feel. Happy, sad, excited, angry. I listen to music and I play music and I sing music to get in touch with my deepest emotions that I would, maybe, not be able to get only by talking or writing. Music plays a enormous role in my life and I shall keep dancing my life "until there's only one thing left: music", as my friend Bruna Zanardi would say.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Púrpura Flor

para Kátia Almeida

E eis que uma vez, do dia para noite, nasceu uma pequena flor no meio do parque da cidade. Era algo diferente, aquele lugar não possuía muitas flores. Na verdade, era o parque mais estranho do mundo. As árvores eram baixas, os animais que passavam por lá eram todos magros, esquálidos. O rio era até bonito, mas bem fininho e silencioso – nada como aqueles enormes e caudalosos sobre os quais os avós contavam histórias. Muitos anos fazia que os peixes nem chegavam perto daquele rio; talvez as algas estivessem com o gosto ruim do abandono.
E eis então que a flor virou assunto da cidade. O Padre citou-a no sermão de domingo (o primeiro que fez com real alegria!). O Prefeito lançou a operação “Protego-floris”, afim de que nada nem ninguém pudesse fazer qualquer mal àquela planta. Os fotógrafos, profissionais e amadores, enlouqueciam-se, tentando achar os melhores ângulos daquela maravilha. Um deles estava até super empenhado para sair em um revista internacional com a sua foto!
A flor era muito bonita – roxa, meio em formato de copo, mas não era bem um copo, talvez o copo que uma rainha usasse, disse a menininha. O pai, sério e atarefado, disse-lhe que parasse com besteiras, mas ela gostava de sonhar que uma rainha fada, disfarçada de borboleta, apareceria e tomaria suas bebidas reais naquele copo roxo, com detalhes em branco-cinza.
Os cientistas analisaram a flor, delicadamente, como lhes cabe. Sabiam que era rara e extremamente frágil e que tinham nas mãos algo lindo. O tempo passava e, apesar de todas as intempéries, a flor resistia e tornava-se cada vez maior e mais maravilhosa.
De tanto ouvirem falar na tal flor, os dois Namorados resolveram ir lá no parque da cidade ver o que estava dando margem a tantos assuntos. Jovens estudantes – ela, bióloga, e ele, literato – ficaram a divagar sobre a beleza da angiosperma. Ela então explicou que, de acordo com o que tinha ouvido sobre a planta, aquela flor chamava-se Digitalis Purpurea, conhecida como “Dedaleira”, e era conhecida por ser guia de néctar, ou seja, abelhas e outros insetos voadores vinham buscar seu pólem.
Ele não entendia nada de biologia, mas adorava ver a namorada falar sobre o que mais gostava. Era ela para ele tão linda quanto a famosa flor. Enquanto ela falava, ele imaginava os animaizinhos todos olhando para a plantinha e cantando alegremente, enquanto o processo de polinização acontecia, sem nem se darem conta.
Ela também gostava de olhar seu namorado e perceber seus olhos castanhos absorverem todas as palavras com amor e atenção. Gostava de quando ele pegava o violão e cantava para ela – pensava inclusive de pedir para que ele fizesse uma música para a planta do momento.
Deram-se os braços e dirigiram-se para o parque. Os passos, as respirações, as bocas, os cabelos, os dedos do pé, tudo era motivo para que ambos estampassem um enorme sorriso em seus rostos. Eram muito felizes e se amavam imensamente.
O parque transmutava-se a olhos vistos. Era agora mais verde, mais cheio de animais, mais agradável e mais, muito mais bonito. O rio ficara maior e os peixes começaram a experimentar aquela água nova que brotava da fonte. A mesma que lá sempre estivera, mas que agora jorrava de forma diferente. A população estava radiante, achavam que aquele era então o mais belo conjunto de árvores de todos – e talvez fosse mesmo.
A flor tornava-se cada vez maior e, quando os Namorados chegaram em seu local, surpreenderam-se com seu tamanho e exuberância. Deixara de ser pequenina. Era praticamente um pedaço do céu de tanta beleza. Os Namorados ajoelharam-se em respeito àquela que fosse talvez a rainha das flores. Uma lágrima correu pelo rosto da namorada e caiu na terra. Como se fosse um agradecimento, a grama onde aquela lágrima caiu tornou-se mais verde.
“Eu amo você” e “eu amo você” e os dois se beijaram. As línguas e bocas buscavam-se com muita ardência. Eram companheiros. Eram amigos. Eram eternos.
Uma noite, uma tempestade gigantesca tomou conta da cidade. Raios, relâmpagos, trovões que metiam medo até no sempre corajoso delegado. A cada novo som, ele se agarrava ao crucifixo e lembrava-se da história contada por sua mãe de que os trovões nada mais eram do que o som dos móveis da casa de São Pedro sendo arrastados para lá e para cá. Casas caíram, mesas viraram, pontes foram alagadas. O sino da igreja despencou e por pouco não atingiu a sacristia. Crianças gritavam, desesperadas. A enorme tempestade arrasou a cidade. No céu, a lua plena chorava.
O momento foi delicado, o estrago foi tamanho, mas a tragédia maior ainda estava por vir. Após as chuvas, as pessoas foram em romaria visitar a flor, como a um santuário. O primeiro que viu foi um menino pequeno, filho do padeiro, que veio correndo contar a seu pai o que tinha acontecido. A flor não estava mais lá. Tinha desaparecido. Não tinha sido arrancada, nem nada tinha caído por cima dela. Ela somente não mais estava lá, como se nunca houvesse existido.
As dúvidas pululavam e nem o padre e nem o psicólogo da cidade eram capazes de explicar o que teria acontecido com a tão maravilhosa planta. Talvez ela tenha fugido para se salvar, disse um. Não seja tolo, disse outro, plantas não fogem. E onde ela está?, perguntou o primeiro. Não faço idéia, oras!, respondeu o segundo.
Os Namorados assistiram à tempestade da janela de sua casa. Temiam pela vida e integridade física de seus amigos e familiares, mas não havia nada que pudessem ter feito para ajudar. E agora choravam pelo sumiço da flor.
Tudo agora mudava de novo, e para pior. O rio voltou a ser fino, as árvores descoloriram-se e os animais foram aos poucos deixando aquela região. Talvez o pior de tudo fossem os namorados, que agora não mais se toleravam. Eram estranhos um ao outro. Hábitos que tinham em conjunto agora faziam cada um sozinho em seus cantos. O violão teve suas cordas arrebentadas com uma tesoura sem ponta. Os livros de biologia agora figuravam entre os papéis para reciclagem. Não mais existiriam.
Muitos disseram que foi tudo um ato de loucura coletiva, outros disseram ser a pura verdade. O que ocorre é que em um determinado momento do tempo – aquela hora do amanhecer que não é noite e nem dia – surgiu uma moça do meio do bosque. Usava um vestido azul brilhoso e sapatos também muito azuis, tinha orelhas pontudas e sorria. Deixou os mais incrédulos de olhos boquiabertos. Lentamente, todos os habitantes da cidade foram para o bosque ver o que era aquela aparição. É assombração, dizia um. É coisa do demônio, dizia outro. Calem-se e deixem-na falar!, dizia um senhor mais velho.
A moça então sorriu e cantou e sua canção falava de tempos imemoriais e épocas distantes, quando todo o planeta vivia em comunhão. A dor não existia, as frutas eram maduras e as árvores sempre com copas frondosas. E, cantando, foi tocando com sua varinha, vários pontos da cidade. Pessoas, casas, igrejas, campos, plantações, tudo voltava ao normal no mais delicado toque e a moça voava com suas pequenas asas. Cantava sobre as cores, as formas, os cheiros do paraíso.
Os namorados – agora separados e sequer se olhando – estavam bem na frente da multidão e ouviam a moça cantar e não sabiam como reagir. Todos estavam experimentado uma sensação de todo nova. Não sabiam o que era, mas sabiam que – seja o que fosse – os transformaria para sempre.
A cidade foi reconstruída em poucos toques. E a moça então chamou a todos na praça principal e disse:
- “Cidadãos, vim de muito longe para ajudá-los. Sabíamos que estavam com problemas e que não conseguiriam resolvê-los sozinhos. Tudo isso foi feito para que vocês consigam novamente viver em paz. Eu sou a guardiã desse local e convenci meus superiores a dar-lhes uma nova chance. Eles aceitaram, porém com uma condição: vocês não se lembrarão de minha passagem por aqui.”
E, percebendo a presença dos dois namorados, disse, sorrindo:
- “Apresento-lhes os Namorados, que cuidarão para que a cidade fique sempre assim, linda e exuberante”.
Eles se entreolharam, atônitos. A fada então desceu do coreto onde estava e falou-lhes: “Vocês serão agora os guardiões da flor. Cuidarão para ela floresça e fique cada vez maior e mais forte. Acham que podem lidar com essa responsabilidade?”. Eles sorriram e deram-se as mãos e disseram que sim. A fada disse: “Que assim seja feito. Esta é a mais importante de todas as flores que já existiram no mundo. Essa é a Flor do Querer. Cuidem bem dela para que o Querer nunca feneça.”
A fada sorriu para todos, para os Namorados, para a cidade inteira. “Parto agora de volta a meu país – o País onde sempre faz Verão – e espero vê-los cada vez mais prósperos e felizes. Cuidem um dos outros.” E começou a subir.
E a menininha, que sabia que aquela flor era de uma Rainha fada, perguntou:
- “Mas quem é você? Quem é você?”
E a fada respondeu, triunfal:
- “Chamam-me de muitas coisas e estou na vida de todos sempre e para sempre. Meu nome é Tempo.”
Lágrimas lavaram o chão da praça e a alma de muitos ali. Os Namorados abraçaram-se, beijaram-se e correram para o lugar onde deveria estar a flor e lá estava ela, ainda mais linda e bela e exuberante, como se isso fosse possível. Eram agora os guardiões oficiais da flor. Eram eternos. Eram eternos.
Se a história é real ou não, gosto de crer que sim. E me encontro com a Rainha-fada, com os Namorados, com a população da cidade e com a Flor do Querer todos os dias, naquele mesmo momento da manhã em que a noite não é dia e o dia não é noite e o pó do sonho se mistura ao pó da memória.


     “Ah, bruta flor do querer,
     ah, bruta flor, bruta flor”,
     (Caetano Veloso)



Tudo o que eu mais quero agora é que você seja amada, respeitada e cuidada. Você merece ser muito feliz, hoje, amanhã e pra sempre, minha querida amiga. (R.M.)

domingo, 10 de abril de 2011

The Princess Who Would Never Cry

para Oscar Wilde

Once upon a time, many and many years ago, there was a castle on the top of a hill. It was a huge castle with many towers, made from rocks from all over the kingdom. In one of the towers lived a princess. She was extremely gorgeous, blonde and shiny as the sun and with eyes as blue as the sea. The princess used to wear very colourful dresses, being then as happy as she was. She was known as the Princess Who Would Never Cry.
Her father, the King, thought the fact of his daughter never finding something worthy of her tears interesting, but somewhat sad. Even when his wife, the Queen, died, his daughter did not show any reaction of sorrow or despair, as it would be expected in a situation like that. Indeed, during the funeral ceremonies, she could barely contain her joy, trapped in an immutable smile. It does not mean that she did not knead the mother, because, of course, she loved her very much, but she was so happy that she could not pretend that she was sad by something as obvious as death. Also she was sure that her mother wouldn’t like her crying.
During the wars that the kingdom fought against other kingdoms, the princess used to hide in her tower, watching the knights fight. Sometimes she was specially cheering for someone, but generally she was only observing the whole act. The roar of the bows and arrows lighted up her dancing. She was not crazy, as many readers may think, but she was only too happy.
The King was concerned, because everyone in the kingdom was happy in some moments and sad in other moments, as any normal human behaviour, except his daughter. He knew that the two emotions were supposed to complete and balance each other; as a pendulum that goes from right to left, a person should go through bad and good moments in life. In spite of all his thinking, he ended up concluding that there was no serious reason for all that concern, since the princess never caused any sort of evil to anyone, not even to herself with her infinite happiness. The King only thought about his daughter’s future life. Someday she would have to cry. That unshakable happiness was not normal. It was hard for the King, considering that she was not doing anything bad, but all this joy was not good, either.
One day, the princess was playing in the woods near the palace. She was picking up the autumn leaves and throwing them to the sky and then standing under them as if she was under the rain. The princess was also singing. She instinctively knew how to sing, because she had never had classes or teachers that could tell her how to do it. Sometimes the birds came around to hear her. Those ones who tried, impolitely, to sing along were quickly silent by their peers. Some other animals also attended that show of joy and beauty.
While singing, the princess did not realize that a man had listened to her singing and had been looking for her. He came closer and closer, faster and faster. He hid himself behind the trees, completely astonished by the beauty and grace of the princess. Some animals noticed his presence and tried to warn her, but she was so busy singing her own happiness that such warnings were not taken into consideration.
The princess sang happily, even when her voice was delicately joined by another voice, a more serious and stronger voice, a sound that she had never heard before. Both remained in the duet that was perhaps the most beautiful song ever sung under those trees, in three hundred years. The princess was worried at the beginning, but she was taken by the melody. As singers do when an aria is finished, the two suddenly stopped, breathless. The man came out from behind the large tree he was hidden. He was tall, strong and undeniably handsome.
The two youngsters fell in love at that exact moment. He was a prince, coming from a very distant region. He had come to fight for the King’s Army and his slaves had heard about the Princess Who Would Never Cry. He had asked around about her, even having to sometimes disburse gold coins, so much that he had discovered her magic hideout. He did not regret. The two went to the palace, together, hand and hand.
The princess was deeply in love. The prince loved her and did not accept losing her. The King was very happy to know that his daughter had chosen a husband; even more being he an ally. The preparations for the wedding began.
But Sadness, which, for several years, had tried to enter the princess’ life, prepared its hardest trick. On the week before the marriage, a war started in the country of the prince and he, being a member of the Royal Family, had to go back and help his father and his brothers to defeat the enemies. Many battles were fought to save the honour of the kingdom, but a struck took the young man’s life. In a treacherous fight, the opponent struck the prince with his cruel sword. He, so beautiful and so loved, could not fight against the inexorable power of death and fell down, closing his eyes forever.
The news were slow to arrive; the messaging systems were all compromised due to the war. The messenger that took the news was thinking of the least shocking way to make everyone aware of the tragic loss. He told it to the King with his eyes looking at the ground and His Majesty said that he was going to solve everything. The marriage had become a funeral. The Princess received the news of the death of her future husband with a smile on the face. She thought it was a joke. It was not.
She ran wildly to the forest and stopped, sitting on a stone. She felt her heart strongly beating in her chest, showing that she was still alive. Her eyes began to burn. Her heart jumped. The tears came to her eyes. In that single moment, the Princess Who Never Cried finally cried. Hours and hours she wept. All the sadness that had never existed to her filled the eyes of the princess. The poor girl cried so much that the tears started to form a pond which became a lake, then a river. When she got tired, she returned home and locked herself up in her room for years, leaving it only to eat. She became then a sad princess.
Some years later, the princess decided to leave her room. She observed the fall of the sun from the top of the mountain. She went down the steps of the palace, without telling anyone. She ran to the edge of the hill. She knew what she wanted: to see the fall of the sun. The princess had a sudden reverie. She saw her lost lover calling her. She ran to him and to death. She fell from the top of the hill. The whole kingdom cried for the Princess Who Never Cried.
In one of my trips, I went to that kingdom and sat next to the river. The wind was calm and seemed to sing. Without realizing it, I lay myself under a tree, which was next to a stone. That tree was the very first one to grow by the river and was at that exact place where the Princess Who Never Cried cried for the first time. I prayed for her and her lover. I gathered my tools and equipment, rode my horse, towards the infinite. The sun followed me, as I went down to the mountains.

Cachecol para Nelson Rodrigues



Ele gostava de ficar ali só olhando. Nada além disso. Olhos. A sala inteira tomada pela fumaça do cigarro de ambos. Fumaça.
Ela nem achava graça nele, parecia meio bobinho quando oferecia um cigarro para ela, mas devia admitir que gostava de ser olhada por ele. Meio esquisito, solitário, deveras estranho e completamente não o seu tipo. Mas gostava de ser olhada.
Passou a usar decotes cada vez maiores só para provocá-lo. Provocá-lo e ver se ele fazia algo mais do que só olhar. Mas ele não fazia nada. Ela tentou se aproximar, deixou cair um lenço para chamar-lhe a atenção. Nada.
Ele não queria nada, só queria ter a chance de olhá-la e a moça não conseguia acreditar que era só isso. Desde muito jovem tinha ela sido objeto de desejo de vários homens, sabia e usava disso para seu prazer. Mas ele não dava trela.
Ofereceu-se a ele. Deixou que visse um seio depois que a redação onde trabalhavam estivesse fechada e eles estivessem sozinhos. Ficou nua para ele. Caminhou nua para ele. Fez pose eróticas, dançou nelsonrodriguesanamente, cantou e nada. Ficara louca com a rejeição. Nunca tinha se sentido rejeitada. Todos eram abrasadoramente apaixonados por ela. Menos ele, que realmente não queria nada, só olhá-la.
Resumo da ópera? Ela matou-se de desgosto em frente ao espelho do banheiro com um cachecol caríssimo. Ele encontrou o corpo.

Ficou ali, parado, olhando, olhando.

quinta-feira, 7 de abril de 2011


Um minuto de silêncio pelas vítimas do atirador do Realengo.

domingo, 3 de abril de 2011

Carta Aberta para o meu eu de amanhã

Todos os dias sofremos pequenos terremotos. Cabelos caem, cílios se dobram e vão ao chão. Esfregamos as mãos e amontoados de células deixam nosso corpo. Juntam-se a poeira do dia a dia. Mudamos. Deixamos de ser o que éramos a um segundo atrás. Você já não é o mesmo que começou a ler este texto. Em poucas palavras, novas idéias já se formaram, para gostar ou não do que escrevo.
Dizem por aí que a vida não é mais do que uma grande despedida – diária – de tudo. Primeiro deixamos as fraldas, depois o berço, depois a escolinha, depois o colegial, a faculdade, um emprego, outro, outro, sempre almejando algo novo, original, atual, que lhe transformará em alguém mais querido, mais bem pago, mais bem sucedido.
Os nossos cérebros estão em constante mudança, sensações surgem, decepções acontecem, casamentos, divórcios, às vezes tudo sem sair do lugar. A função do artista é registrar os momentos. Escrevendo, atuando, cantando, pintando, sendo.
A nostalgia é como um bom whisky. Deve ser tomada com cuidado e respeito, pois os dois podem levar ao coma. O álcool no corpo dá-lhe poder, invencibilidade. Sabe tudo, conhece tudo. E não é verdade. A nostalgia dá-lhe a certeza de que tudo foi melhor no seu tempo.
As meninas mais comportadas. Os rapazes mais preocupados com o futuro. Os jovens menos esquisitos. A violência menor. A promiscuidade menor. A patifaria menor. Mesmo que não se pense em termos genéricos e fique-se só com o seu próprio passado.
Diz-se que é no pó do sonho – o que resta na cama ao acordarmos, mas antes de estarmos de fato acordados – que nos encontramos com as vidas passadas ou com o mundo das fadas. E é lá que cultivamos nossas esperanças de que tudo vai ser melhor no fim.
Um dia terei meu jardim de rosas para cuidar. Um dia não precisarei mais cozinhar sempre. Um dia terei milhões de dólares na minha conta. Um dia não trabalharei mais vinte e nove horas por dia. Um dia encontrarei alguém que me entenda. Um dia encontrarei a mulher da minha vida. O homem da minha vida.
A nostalgia é como pontadas no coração. A saudade é escura, torpe, inaceitavelmente aceitável. Pode ser clara, alegre e feliz. A nostalgia e pensamentos como “e se?” produzem combinações bombásticas e possivelmente mortais. Viver no sonho faz com que nosso chão torne-se mais alto e a queda mais violenta.
O real não abre, mas escancara as janelas. Estraçalha o incerto. Esmigalha o desmilingüido irreal. A fantasia ajuda a tornar tudo mais palatável. A nostalgia é a droga mais forte do mundo.
Se vamos para outro lugar depois da morte? Possivelmente. Lá, porém, já não somos mais o que somos aqui. Vida como vida nossa somente por aqui e somente uma. Dizem os árabes: “Não se perde tempo, perde-se vida”.
Os pequenos terremotos devem servir para levar-nos adiante e não o retrocesso. A saudade e a nostalgia devem ser como doses de whisky a serem tomadas em momentos especiais por quem saiba apreciar seus sabores.
O mundo real é duro e o pó do sonho é um presente da Deusa, do Deus, das fadas, de Buda, de Jah, de Osíris, de Zeus para que possamos agüentá-lo. Contava-se a história das Parcas do tempo - três velhas senhoras que teciam nosso destino - uma bordava o passado, outra o presente e outra o futuro. Quando chegava a hora, cortavam a linha.
Prendendo-nos ao passado acabamos condenados à sina dita por Bukowski, talvez a pior de todas – uma vida imensa, cheia de belíssimas desculpas por não termos feito nada com ela e com todas as maravilhas que nos são oferecidas todos os dias, a própria vida ali - por vezes abandonada e sozinha.
Até o momento da Parca do futuro cortar nossa linha.