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espero que vocês divirtam-se muito lendo minhas palavras. Peço, porém, por ser esse um trabalho independente, que não republiquem meus textos - inteiros, partes, frases, versos - sem minha expressa autorização. A pena para crime de plágio é dura, além de ser algo bastante humilhante para quem é processado. Tenho certeza que não terei problemas com relação a isso, mas é sempre bom lembrar!

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segunda-feira, 13 de junho de 2011

Anestesia ou O Ninho de Vespas

Isso já faz muito tempo, mas eu me lembro como se fosse hoje. Muita coisa já se apagou na poeira densa da memória, mas consigo me lembrar das sensações todas. A escola em que eu estudava quando era muito pequeno funcionava em uma chácara em um bairro bem afastado da cidade, cheio de árvores, animais e poucas casas. Um terreno enorme em que pulávamos, corríamos, brincávamos de tudo possível. Tinha lá meus três, quatro, cinco anos e tudo era novidade. Fazer bolos de areia era o máximo, correr por correr só pra sentir a força do vento, explorar plantas misteriosas, tudo isso fazia parte do meu dia a dia.
Em um desses passeios, analisando a casa de madeira que ficava no centro da escola encontrei algo que chamei de ninho. Era uma estrutura diferente, feita de um material meio gosmento, mas duro. Com os dedos fui sentindo as texturas e percebi a fragilidade daquilo. Parecia um funil ao contrário. Era um ninho de pequenos animaizinhos voadores que depois vim a saber que era vespas. Vespinhas dessas inofensivas que só voam pelos lugares, mas não atacam e nem picam. Fiquei extremamente atraído por aquilo e várias vezes dava eu corria e brincava pela escola e acabava por ficar lá perto, só admirando o vôo das vespas na sua volta para casa. Confesso que fiz testes para saber o quanto aquela fortaleza frágil agüentava e por vezes amassei aquele material para fechar a entrada e ver o que elas fariam. Quando voltava no outro dia e ia lá procurar, elas tinham conseguido fazer outro buraco para poder sair de seus abrigos.
Tornaram-se elas então um ponto de tranqüilidade naquele lugar por vezes inóspito. O interessante é que sempre que eu brigava com algum coleguinha ou levava bronca por algo que eu – obviamente – não tinha feito eu corria para o “ninho das vespas” e me sentia protegido. Elas eram como se fosse um esquadrão de soldados muito corajosos que protegeriam seu imperador (eu – em uma demonstração clara de que megalomania não tem idade) e fariam seus inimigos em pedaços. Sempre fui uma criança muito criativa, que falava sozinha e que tinha poucos amigos, mas bons. Talvez isso explique porque eu tinha as vespas em tão alta conta.
O tempo foi passando e eu me esqueci desse ninho, me esqueci das vespas e me esqueci de muitas coisas. Criei então outros refúgios para quando estivesse triste. A escola que eu estudava faliu e a chácara foi comprada por ninguém menos que minha mãe e sua sócia para fazerem uma outra escola, com outros alunos e professores. Por isso ainda mantenho certo contato com a chácara, já muito mudada, assim como eu. Aquela que era enorme e cativava meu interesse, agora é um espaço normal. Eu cresci, a chácara é a mesma. A sensação é diferente. Por um instinto fui procurar meu ninho de vespas para perceber que nada mais existia lá. Elas já tinham partido dali e o vento e as chuvas fizeram seu papel, lavando tudo. Hoje lá só encontro a madeira da casa. Devo dizer que fiquei até um pouco chateado, apesar daquele ninho de vespas não estar lá há muito tempo.
Pensei nos outros refúgios que criei para quando a tristeza viesse pintar meu céu de cinza. A música, meus instrumentos – todos com seus devidos nomes e histórias e mesma importância –,  meus livros e filmes – os dois minha possibilidade de viajar por outros mundos – minha família, meu quarto, minha cama, meus escritos. Cada um deles com seu valor, seu passado, seu presente e futuro.
Pensei também em meus amigos, meus grandes amigos, meus irmãos que a vida me fez encontrar e que tenho muita sorte de ter agora que estou passando uma fase meio barra pesada. Estou lidando com a dor da perda do meu cachorro de muitos anos e com uma doença na família de uma pessoa muito próxima. Uma doença cretina, silenciosa e odiosa. De formas diferentes, com pequenos gestos, todos estão me acolhendo e demonstrando o carinho que tem por mim. Faço questão de retribuir de qualquer maneira possível.
Dizem por aí que o ser humano é uma ilha. Até pode ser. Cada um pensando nos seus problemas, nas suas frustrações, nos seus desejos e realidade. Eu sei, porém, que compartilhamos sensações, memórias, risadas e lágrimas todos juntos. Diferentes, mas os mesmos. Mais velhos, mais novos, mais sabidos, mais vividos, com muita ainda por viver. São todos ilhas, mas são meu arquipélago e não deixarei nenhum deles se afundar e eles também cuidam para que eu não me afunde.
Achei neles as minhas vespas. Talvez a comparação não seja das mais românticas, mas tem um sentido muito especial para mim. São meus soldados, são aqueles que me protegem das adversidades e da loucura. Não sou seu imperador – é óbvio - e nem quero ser, a união de pessoas tão diferentes já me basta.
A dor é líquida, se transforma em choro. A saudade é um veneno que tomamos aos poucos para ficarmos vivos. Vejo a amizade como blocos de concretos aos quais posso me agarram para não cair no abismo da solidão.
Estou anestesiado. Não curado das dores dessa vida que vão chegando sem dar aviso – e que eu, em minha jovem idade, ainda nem faço muita idéia -, mas com as baterias recarregadas para enfrentá-las de cabeça erguida. E esse mérito é todo de vocês, meus amigos, meus amados amigos. Depois eu choro, depois. Agora eu sorrio pensando em vocês. Obrigado.

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