Desde muito
cedo pensei sobre o que seria o meu futuro. Desde muito cedo pensei onde
estaria na idade que estou agora. Muito cedo decidi qual seria minha profissão
ideal: ator. Era simplesmente porque os atores podiam viver várias vidas sem
ter que de fato decidir por nenhuma delas. Eu tinha tantas opções que me
interessavam, podia ser médico, acrobata, limpador de janelas. Cedo decidi que
seria ator. Quando veio o fatídico dia do vestibular, eu já sabia que prestaria
teatro em algum canto, seria aceito e tudo ficaria bem. Não fui aceito e não
ficou tudo bem. Perdi o chão, fiquei desnorteado e todos os clichês que se
seguem a um fracasso. Fiz cursinho, conheci muita gente, inclusive de teatro, e
resolvi percorrer o caminho das letras. Não me arrependo, acho que o escritor é
um tipo de ator, só que ele não age, ele imagina, fica trancado em seu quarto
escrevendo sobre guerras inteiras, por vezes apenas interiores. Guerras reais e
guerras interiores.
O problema é
que fazer letras abriu ainda mais minha cabeça para o mundo, para as
injustiças, para as relações humanas e suas verdades e mentiras que se mesclam
sem que ninguém nunca saiba onde começa uma e termina a outra. Às vezes eu só
queria ter um rompante de criatividade e sentir as palavras fluindo de meus
dedos para a tela do computador para criar uma obra de arte fantástica, uma
história que fique na cabeça de todos, que seja discutida em aulas de
literatura e que me permita comprar um apartamento.
Eu sempre me interessei por apartamento, talvez por nunca ter morado em um. Aquela coisa sala meio quarto meio cozinha me agrada. Sei que muita gente deve odiar morar em quitinetes ou pequenos apartamentos, mas nesse momento era tudo que eu queria. Arrumar meus livros em estantes e não mais deixá-los empilhados por aí. Dar um lugar justo para Lygia Fagundes Telles, para Caio Fernando Abreu e tantos outros. Juntar por assunto ou por área ou por escritor. Deixar minhas roupas bacanas nos cabides e não enfiadas nas gavetas com cheiro de nunca mais. Dinheiro é um problema real e eu odeio isso.
Nunca achei
que dinheiro fosse ser um problema tão real. Não gosto de dinheiro, nunca
pensei em ter muito dinheiro, mas agora vejo como essas notas malditas são
necessárias. A sociedade não gosta de artistas, nunca gostou, não sei porque
achei que seria diferente comigo. Trabalho porque preciso pagar minhas contas e
ainda assim trabalho muito e ganho pouco, situação que pretendo melhorar em
breve. Procrastinação é algo que se enreda na gente e deixamos tudo parado –
vida, relacionamentos, pensamento, livros. Agora estou aqui e são quase três da
manhã e eu não consigo dormir porque tenho pensamentos sobre o futuro.
Dizem que o
Machado de Assis escrevia cinquenta páginas por dia e poucas delas ele usava
para seus romances e ficou conhecido como o maior autor brasileiro, mesmo que
hoje poucas pessoas o leiam e das que leem poucas o entendem. Eu quando escrevo
é só uma, duas quando a inspiração é grande. Eu podia simplesmente largar tudo
e desistir de escrever, já que eu não sirvo para isso, mas não consigo.
Simplesmente não consigo. Tem vezes que eu fico parado, muitas vezes até no
meio de uma conversa e fico pensando em cenas, personagens ou frases que
precisam ser colocadas no papel. Podem até ser jogadas fora depois, mas
precisam pelo menos ser vistas por esses meus olhos sonhadores.
Acho que ser
muito sonhador é o que me atrapalha. Se eu sonhasse menos e fosse menos
viajante, talvez já tivesse conseguido algo mais concreto.
E como eu faço
para ser menos viajante?